sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Marisa, Teresa e Diogo na noite linda da Portela


Foi uma noite linda - como bem definiu Marisa Monte após cantar Volta meu Amor (Manacéa e Áurea Maria) com a Velha Guarda da Portela no palco do Circo Voador, na Lapa, um dos redutos cariocas de culto ao samba. Idealizado para promover a estréia nos cinemas do documentário O Mistério do Samba, que desvenda a a poesia dos bambas da tradicional escola de samba, o show que junta Marisa, Teresa Cristina e Diogo Nogueira ao grupo chegou ao Rio de Janeiro após encantar São Paulo. Aos primeiros minutos deste sábado, 30 de agosto de 2008, cenas do filme começaram a ser exibidas no telão posicionado atrás do picadeiro do Circo Voador ao som de Nascer e Florescer (Manacéa). Na seqüência, já no palco, a Velha Guarda da Portela abriu o show com Vivo Isolado do Mundo (Alcides Dias Lopes) e o que se viu e ouviu, dali em diante, foi uma apoteose do samba mais nobre, cantado a plenos pulmões pelo público jovem que hiperlotou o Circo e que chegou a emocionar Teresa Cristina pela devoção ao repertório de compositores que criaram suas obras no anonimato.

Debilitado, ainda se recuperando de problemas de saúde, Monarco se apresentou sentado e deixou o comando da primeira parte do show na voz de seu filho, Mauro Diniz. Foi quando uma reciclada Velha Guarda sacudiu o Circo com os sambas Tudo Menos Amor (Monarco e Walter Rosa) e Nega Danada (Que Mulher) (Chatim) - este emendado com Ouço uma Voz (Candeia e Nelson Amorim). O público estava ali para reverenciar compositores e ritmistas como David do Pandeiro, Casemiro da Cuíca, Marquinhos do Pandeiro, Edir da Portela e Serginho Procópio, que recentemente assumiu o posto de cavaquinista no grupo. Sem falar em Casquinha, que - também sentado, ao lado de Monarco - cantou trechos de Recado, a parceria que fez com Paulinho da Viola nos anos 60, e de A Chuva Cai, o samba que compôs com Argemiro Patrocínio (1923 - 2003) e que ficou conhecido no Brasil pela voz (sempre) antenada de Beth Carvalho.

Havia uma magia na noite que disfarçou o tom menos empolgante de números como Você me Abandonou (Alberto Lonato) e Sentimentos (Mijinha). Assim como a ligeira desafinação de Diogo Nogueira em seus cinco números individuais. O portelense Diogo estava à vontade, em casa, e eletrizou o Circo Voador ao reviver sambas irresistíveis como Corri pra Ver (Chico Santana, Monarco e Casquinha), Lenço (Francisco Santana e Monarco), Coração em Desalinho (Monarco e Ratinho), Vai Vadiar (Monarco e Alcino Corrêa). Raras vezes, o jovem cantor mostrou tanta segurança ao incursionar por repertório alheio. Na presença de um dos autores.

A propósito, Monarco é o compositor de boa parte dos sambas apresentados naquela noite feliz. E, também por isso, foi saudado por uma emocionada Teresa Cristina logo após a apresentação de Quantas Lágrimas (Manacéa) e teve seu nome repetido em coro pela juventude que se esprimia na platéia do Circo. Embora nem sempre primasse pela técnica exemplar, a cantora manteve o pique do show ao cantar sambas como Minha Vontade (Chatim), Gorjear da Passarada (Argemiro e Casquinha), Sabiá Cantador (Alvarenga) e o altíssimo partido A Paz do Coração (Candeia e Cabana). Sua participação foi tão bonita que o público começou a gritar seu nome. "Teresa! Teresa!", repetia o público, fazendo a artista se emocionar novamente. "Eu vou chorar", avisou Teresa...

A presença elegante e luminosa de Marisa Monte - grávida de seis meses - acentuou a magia da noite, iniciando seu set com Volta meu Amor (Manacéa e Áurea Maria). Após uma apoteótica Dança da Solidão (Paulinho da Viola), a cantora entoou samba inédito em sua voz, Sofrimento de Quem Ama (Alberto Lonato), e reviveu Esta Melodia, da forma como havia gravado este belo samba de Jamelão (1913 - 2008) e Budu da Portela no álbum Cor-de-Rosa e Carvão (1994). No bis, Marisa apresentou outro samba de Manacéa, Volta, abrindo caminho para Foi um Rio que Passou em Minha Vida (o samba de Paulinho da Viola que o público já cantara sozinho antes do bis), já com Diogo Nogueira e Teresa Cristina de volta ao palco. Enfim, um show memorável, pontuado por trechos do documentário sobre a Velha Guarda da Portela que chegou, enfim, aos cinemas, viabilizado pelo projeto Natura Musical. Como um rio, a história majestosa da Portela passou pelo Circo através de 23 sambas que guardam mistério em sua nobreza.

Fotos: Luciana Oliveira
Texto: Mauro Ferreira
http://blogdomauroferreira.blogspot.com/

Evento ocorrido na sexta-feira, 29 de agosto de 2008.

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